sábado, 3 de julho de 2010

Rússia: um destino surpreendente

Morar em um país distante, longe de suas raízes, de seus amigos e de sua família pode dar origem a um friozinho na barriga. No entanto, sair da zona de conforto, conviver com pessoas aparentemente estranhas, descobrir semelhanças e aprender com as diferenças, com certeza significa um ganho pessoal incomparável.

FOTO: "Orla" de Ufa, capital da República do Bascortostão, leste da Rússia europeia.

Vinícius Lopes, formado em Letras pela UFJF fez de sua experiência de intercâmbio uma grande oportunidade para sua vida profissional. Por meio desta, tornou-se um líder empreendedor e, hoje, aplica os conhecimentos adquiridos durante os três meses em que passou na Rússia, em sua própria escola de idioma. Veja o que Vinícius tem a contar sobre esta enriquecedora aventura:

A decisão de fazer um intercâmbio

Exige-se do homem, hoje em dia, uma visão cada vez mais pluricultural. Hábitos de viagem nos levam à busca por conhecer melhor o mundo e nossas habilidades de adaptação a outros ambientes. Apesar de não concordar muito com essa política que tem tornado experiências no exterior condição sine qua non, entendi o quanto poderia lucrar pessoal e profissionalmente de uma viagem para o exterior.


FOTO: Na famigerada Praça Vermelha, em minha viagem à capital Moscou.

Descobri na AIESEC a oportunidade de realizar um sonho pessoal, conhecer a Rússia, e aprimorar minhas qualidades acadêmicas no ensino de língua inglesa. No final de 2008, me senti pronto para encarar essa jornada, formado em Letras pela UFJF e com apoio dos amigos e suporte da família.

Voltei certo de que viajei no momento mais adequado. Foi uma mudança completa de rumo: saí da vertente acadêmica e me desafiei ao empreendedorismo. Hoje, um ano depois, digo que valeu a pena cada medo que eu enfrentei e toda insegurança que superei.

A escolha da Rússia como destino

Sempre quis conhecer a Rússia por dois de seus atrativos: arquitetura e história. Mas, após decidir fazer um intercâmbio pela AIESEC, houve um longo processo de procura por vagas para mim. Eram muitas possibilidades em diversos países, uma vez que eu era um dos poucos candidatos do programa Teaching to Learn disponíveis na época. Fui selecionado para estagiar durante três meses no Centro de Educação Intensiva
B.IQ., na cidade de Ufa, capital da República do Bascortostão, nos Montes Urais, parte europeia da Federação Russa. Dar aula de inglês apresentando a cultura brasileira foi uma combinação muito atraente. Igualmente, a oferta de acomodação, alimentação e transporte, bem como um salário, além do carinho no trato por parte da @ UFA me fizeram viajar confiante de que teria uma experiência muito positiva.

Diferenças culturais entre Brasil e Rússia

O que exige muita adaptação é o clima. Mesmo no final da primavera, fazia -20ºC. Chegou o verão e, por conta da estrutura própria para suportar o longo inverno, faz um calor muito abafado. A arquitetura, as comidas, os cheiros… é tudo muito diferente do que estamos acostumados a ter no Brasil. É uma cultura que ainda permanece pouco próxima de nós. Pequenos detalhes nos hábitos higiênicos e alimentares parecem questionáveis.


FOTO Lê-se "Rio" na entrada do café em homenagem ao Brasil.

O trânsito – que admite dois paradigmas do motorista, já que o mercado local importa automóveis com volantes à esquerda e à direita – era muito confuso e eu me sentia inseguro andando de carro. Os ônibus têm um sistema de nomes para cada estação, sem roleta e com pagamento feito direto ao motorista na saída. Ou seja, difícil para quem está acostumado a puxar a cordinha.

Na região em que morei, as religiões predominantes são o catolicismo ortodoxo e o islamismo, ambas consideravelmente diferentes do que se vê costumeiramente no Brasil, principalmente no que diz respeito ao comportamento das mulheres – há uma grande valorização do casamento e rigorosas críticas sexistas.

O fim da União Soviética ainda é recente e o histórico político e social dos russos os tornou um povo alegre, porém desconfiado e temente a novas revoluções. Sexo é um dos maiores tabus – eles acreditam que não há gays lá, por exemplo.

Sair de casa e olhar para os outdoors, placas, propagandas e não entender nada é muito desconfortável – aprender o idioma é um desafio, primeiramente, por conta do alfabeto cirílico, mas também por conta da gramática russa, que faz uso de um sistema de declinações que modificam até nomes próprios, dependendo do contexto. Mas quis interpretar tudo de uma forma positiva e gostei de viver nos padrões russos durante esses três meses.

O impacto do intercâmbio na vida profissional

Fui em busca de crescimento profissional, que era a minha prioridade no momento. Muito se fala em pós-graduação, mestrado e doutorado. Vejo as pessoas muito preocupadas em entenderem como o homem funciona, mas poucas sabem entender como conviver junto aos homens. Sempre achei a Rússia muito diferente do Brasil. Ao mesmo tempo, o bloco BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) aponta para as nossas semelhanças. Fui atrás de informações sobre a visão de mundo deles. Provou-se muito diferente por várias experiências que vivi.

Nesse tempo, trabalhei com uma metodologia muito interessante, eficiente para o ensino de inglês e diferente de tudo com o que já havia trabalhado e estudado no Brasil. Como minha maior experiência no Brasil foi com um grande público popular e menos favorecido economicamente, trabalhar com grandes empresários me exigiu muitos esforços dos quais não lançara mão até então. Foi um choque grande e positivo.

O maior e mais inesperado ganho foi ter sido desafiado a trazer o Centro de Educação Intensiva para o Brasil. Hoje sou dono do meu próprio empreendimento, fruto da minha experiência na AIESEC e valiosa aliança entre mim e meus amigos e parceiros profissionais russos.

O desafio com o idioma russo

A influência da cultura de países de língua inglesa é menor na Rússia do que no Brasil. Entretando, eles têm mais contato com diferentes línguas do que nós aqui – a região onde morei tem dois idiomas oficiais e muitos têm o alemão como língua estrangeira preferida. Principalmente por isso (mas também por questões fonológicas), os russos têm mais traquejo para lidar com outros idiomas. Entretanto, foi a metodologia da escola em que trabalhei que possibilitou minha comunicação com os alunos, sem que eu soubesse russo ou eles português. Antes de cada aula, eu preparava diálogos com uma estrutura específica, com a qual os alunos já tinham familiaridade. Além disso, expressões corporais também fazem parte da comunicação e o professor de língua estrangeira que toma consciência disso consegue desenvolver um trabalho muito mais eficiente.

Uma experiência de liderança


Meus diretores russos foram dois grandes exemplos de líderes: um de tudo que eu almejo alcançar, outro de tudo que eu não quero para mim. Felizmente fiquei muito próximo de um deles.

FOTO Com Natalia "Natasha" Anatolyevna, my Russian Boss.

Natasha, a minha diretora, é uma mulher muito inteligente, criativa e cheia de gás para por suas ideias em prática, sempre com muita garra para alcançar suas metas. Ela me incentivava a todo momento. Ela tem a cara da AIESEC e, assim, alinhada com os interesse organização, ela é capaz de enxergar o potencial de cada um dos aiesecos que ela recebe. Ela enxergou o meu melhor e explorou isso, porque sabia que o lucro seria para ela também, com alunos satisfeitos e, consequentemente, mais clientes e mais lucros. Foi então que, depois de muitos elogios meus ao material, ela me intimou a passar de professor de inglês a businessman.

O impacto do intercâmbio no desenvolvimento pessoal

Morar em uma cidade estranha, longe de toda sua história, família, amigos, cultura e etc., te leva, antes de mais nada, a seguir instintos. Porém, racionalizar a situação só é possível se você aprende a controlá-los. E foi assim, negociando entre minhas raízes e minha adaptabilidade, que achei o meio termo ideal para me sentir à vontade e me manter de coração e mente abertos durante a minha viagem.


FOTO "Global Village", evento da AIESEC Ufa.

Longe do Brasil, me senti brasileiro, com minhas preferências, hábitos e jeito de pensar diferentes daqueles dos russos. Mais que isso, me senti cidadão do mundo, presente em um país tão distante, conseguindo me comunicar em inglês, capaz de arranhar no russo e me dando tão bem com as pessoas. Falando do meu país e aprendendo tanto sobre outro me levou a me entender como apenas uma grande peça nesse grande quebra-cabeça que é o mundo. Com paciência, tudo se encaixa, redondinho.


Source: www.aiesecjf.org
http://www.aiesec.org.br/site/escritorio/juizdefora/russia-um-destino-surpreendente/

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